Tem gente que erra nas escolhas da vida, esse supermercado cheio de produtos variados. A mania de pegar a embalagem bonitinha muitas vezes faz a gente levar pra casa uma coisa 'mais ou menos'. Fiquei pensando nisso por causa de um desses bate-papos no ônibus. Apesar da minha cara de poucos amigos, tem gente que arrisca puxar um papo no coletivo. Uma moça bem comunicativa, por sinal, foi a corajosa da semana passada.
Conversa vai, conversa vem, soube que ela, de idade indefinida como a maioria das pessoas é para mim, era casada há 14 anos com um desses loucos por futebol. O casal tem três filhos e a família inteira é rubro-negra, com a graça de Deus. Se o papo não tivesse esticado tanto, as primeiras informações nem teriam causado estranheza.
Com o trânsito lento, a moça perguntou se tinha jogo no Maracanã. Dã, uma terça-feira... pensei 'em que mundo esta mulher vive?!', mas respondi que não, que deveria ser outro problemas, mas que ela se preparasse para a quarta seguinte, por causa da final da Libertadores com o Fluminense, uma combinação que promete levar todos os carros do mundo para o entorno do estádio. Soube que ela morava em Cascadura, longe da estação de trem, mas que seria a condução daquele dia, na próxima semana, para evitar o congestionamento. Ela agradeceu e disse que não acompanhava futebol.
Tudo bem, muitas mulheres ainda têm esse preconceito bobo de que futebol é coisa de homem. Pô, mas ela casou com um cara que assiste a TUDO de esporte na TV no fim de semana, conforme informação da própria.
— Ele piorou depois que teve de parar de jogar, por causa de um acidente de moto; rompeu os ligamentos.
Mas o que mais me espantou foi a revelação bombástica:
— Acho que sou a única pessoa no mundo que nunca gritou gol na vida!
Aquilo me chocou. A moça deveria ter mais ou menos a minha idade. No mínimo, no mínimo, viu o Brasil ganhar duas Copas do Mundo e chegar bem perto disso em pelo menos outras duas ocasiões. Como assim ela jamais deu um grito de gol na vida? Entristeceu bastante ela ter falado aquilo com a maior naturalidade. Não era coisa de quem não gostava do babado; parecia mais um troço tão reprimido, tão reprimido, que chegou a uma conformidade tal que denotava aquela naturalidade que me assustou.
A consciência da solidão nessa 'não atitute' da moça me tocou. Fiquei pensando nisso a semana toda, apesar do caderninho de pós, que geralmente é algo que me consome. Lembrava da moça (bonitinha, até), pensava no marido louco por futebol, na família em vernelho-e-preto e naquela emoção que ela se privava durante toda a vida. Aí me vinham à mente as lembranças dos momentos que passei no Maracanã, na sala de casa e até em locais públicos, gritando loucamente com um gol, abraçando estranhos e pessoas que acabara de conhecer, mas que por causa do gol viravam amigos de infância... fiquei tocada com a moça.
****
Mas o que que deixou mais encafifada foi pensar no marido, louco por futebol, fanático por qualquer tipo de esporte, vivendo há 14 anos (mais um de namoro, como ela me disse) com aquela pessoa que, pelo jeito, morreria com o grito de gol entalado na goela.
Que coisa triste.
O cara pega um potinho bonitinho na prateleira do mercado da vida, abre, vê que o conteúdo tem um cheiro bom (isso é uma figura de linguagem, seus maldosos), uma aparência agradável... mas é completamente sem sal. Insoso. E ele tem que engolir aquilo porque é tipo canja de galinha — você não gosta muito, prefere outros pratos, mas come porque alimenta, é quentinho e faz bem pra saúde...
Conversa vai, conversa vem, soube que ela, de idade indefinida como a maioria das pessoas é para mim, era casada há 14 anos com um desses loucos por futebol. O casal tem três filhos e a família inteira é rubro-negra, com a graça de Deus. Se o papo não tivesse esticado tanto, as primeiras informações nem teriam causado estranheza.
Com o trânsito lento, a moça perguntou se tinha jogo no Maracanã. Dã, uma terça-feira... pensei 'em que mundo esta mulher vive?!', mas respondi que não, que deveria ser outro problemas, mas que ela se preparasse para a quarta seguinte, por causa da final da Libertadores com o Fluminense, uma combinação que promete levar todos os carros do mundo para o entorno do estádio. Soube que ela morava em Cascadura, longe da estação de trem, mas que seria a condução daquele dia, na próxima semana, para evitar o congestionamento. Ela agradeceu e disse que não acompanhava futebol.
Tudo bem, muitas mulheres ainda têm esse preconceito bobo de que futebol é coisa de homem. Pô, mas ela casou com um cara que assiste a TUDO de esporte na TV no fim de semana, conforme informação da própria.
— Ele piorou depois que teve de parar de jogar, por causa de um acidente de moto; rompeu os ligamentos.
Mas o que mais me espantou foi a revelação bombástica:
— Acho que sou a única pessoa no mundo que nunca gritou gol na vida!
Aquilo me chocou. A moça deveria ter mais ou menos a minha idade. No mínimo, no mínimo, viu o Brasil ganhar duas Copas do Mundo e chegar bem perto disso em pelo menos outras duas ocasiões. Como assim ela jamais deu um grito de gol na vida? Entristeceu bastante ela ter falado aquilo com a maior naturalidade. Não era coisa de quem não gostava do babado; parecia mais um troço tão reprimido, tão reprimido, que chegou a uma conformidade tal que denotava aquela naturalidade que me assustou.
A consciência da solidão nessa 'não atitute' da moça me tocou. Fiquei pensando nisso a semana toda, apesar do caderninho de pós, que geralmente é algo que me consome. Lembrava da moça (bonitinha, até), pensava no marido louco por futebol, na família em vernelho-e-preto e naquela emoção que ela se privava durante toda a vida. Aí me vinham à mente as lembranças dos momentos que passei no Maracanã, na sala de casa e até em locais públicos, gritando loucamente com um gol, abraçando estranhos e pessoas que acabara de conhecer, mas que por causa do gol viravam amigos de infância... fiquei tocada com a moça.
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Mas o que que deixou mais encafifada foi pensar no marido, louco por futebol, fanático por qualquer tipo de esporte, vivendo há 14 anos (mais um de namoro, como ela me disse) com aquela pessoa que, pelo jeito, morreria com o grito de gol entalado na goela.
Que coisa triste.
O cara pega um potinho bonitinho na prateleira do mercado da vida, abre, vê que o conteúdo tem um cheiro bom (isso é uma figura de linguagem, seus maldosos), uma aparência agradável... mas é completamente sem sal. Insoso. E ele tem que engolir aquilo porque é tipo canja de galinha — você não gosta muito, prefere outros pratos, mas come porque alimenta, é quentinho e faz bem pra saúde...
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